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Não há vínculo empregatício de entregadores com iFood

A juíza do Trabalho Shirley Aparecida de Souza Lobo Escobar, substituta na 37ª vara do Trabalho de SP, julgou improcedente ACP contra o serviço de entregas iFood. A magistrada concluiu que não há vínculo empregatício dos entregadores com a plataforma. A decisão é desta segunda-feira, 27.

O MPT da 2ª região postulou a declaração da existência de relação de emprego dos entregadores e condutores profissionais que prestam serviços de transporte de mercadoria intermediados por suas plataformas digitais, e demais pedidos decorrentes do reconhecimento da relação empregatício. Na inicial, o parquet alegou que a plataforma atua como “verdadeiro sistema de servidão digital”.

A lide tratou do caso dos autônomos que trabalham no modelo full service, ou seja, autônomos cadastrados pelo iFood. Em outro modelo, o marketplace, o iFood coloca um restaurante em sua plataforma, mas o próprio restaurante contrata seus empregadores.

 

Ausência de pessoalidade

A magistrada explica na sentença que a atividade do iFood é na área de tecnologia de aplicativo de internet, possibilitando ao usuário do aplicativo (cliente final) a compra de refeição no restaurante de sua preferência, dentre aqueles que ofertam seus produtos por intermédio do aplicativo, para ser entregue no local determinado por intermédio de entregador previamente cadastrado no aplicativo e escolhido de forma aleatória, considerando a proximidade com o restaurante que vendeu a refeição.

“O modelo não envolve apenas motofretistas. Nos grandes centros, como na cidade de São Paulo, é bastante comum ver entregadores com suas caixas se locomovendo de bicicletas, bicicletas elétricas, patinetes e mesmo caminhando.”

Ao analisar a atividade do operador logístico, a julgadora conclui que a relação da plataforma com o operador logístico “é de típica terceirização de serviços”.

“Esse é o modelo de negócio e as exceções ou falta de cumprimento de obrigações legais não desnatura o modelo, devendo ser tutelada em sede própria individual naquilo que excedeu ou não se pautou de acordo com a legalidade, respondendo pelas obrigações tanto o empregador quanto o tomador dos serviços conforme estabelecido na lei.”

A julgadora colheu dos depoimentos que o entregador na forma de vinculação direta (nuvem) pode, ao se colocar em disponibilidade para receber chamadas para entrega, escolher a entrega que fará considerando que antes de aceitar lhe é dado conhecer a distância e o valor que será pago, escolher o aplicativo por intermédio do qual fará a entrega uma vez que pode se vincular a diversos aplicativos de empresas diferentes e, ainda, escolher a rota por intermédio do aplicativo que melhor lhe convier.

“Considerando que o entregador pode recusar a chamada para a entrega, ou seja, pode escolher a entrega que fará, além de escolher por intermédio de qual aplicativo fará (para qual empresa fará), resta evidenciado que não está presente na relação em análise o requisito da pessoalidade.”

Segundo a juíza Shirley Escobar, a situação se assemelha àquela vivenciada pelos trabalhadores de salão de beleza que embora realizem a atividade-fim da empresa, utilizando-se da estrutura física, não são reconhecidos como empregados por ausência de requisitos do vínculo de emprego. Quanto à jornada de trabalho, a julgadora também rechaçou a tese autoral de “servidão digital” dos entregadores.

“O empregado pode ter jornada de 16 horas sem receber uma única hora extra. Basta manter dois empregos como é permitido pela legislação. O empregado também pode ter jornada mensal de 382 horas mensais, sem receber uma única hora extra. É encontrado nessa situação uma grande parcela de trabalhadores da área da saúde que laboram em escala 12×36 perfazendo jornada de 191 horas por mês para cada empregador.”

De acordo com a juíza, ficou demonstrado que o trabalhador se coloca à disposição para trabalhar no dia que escolher trabalhar, iniciando e terminando a jornada no momento que decidir, escolhendo a entrega que quer fazer e escolhendo para qual aplicativo vai fazer uma vez que pode se colocar à disposição, ao mesmo tempo, para quantos aplicativos desejar.

Assim, julgou improcedente o pedido de reconhecimento de vínculo de emprego entre os entregadores e o iFood.

Por fim, na longa sentença, a julgadora anota que todo trabalho humano deve ser protegido pela lei, na medida que não sufoque, aniquile, impeça ou dificulte o desenvolvimento, quando o modelo decorrente não implicar em ilegalidades. E que “não cabe ao Judiciário alargar um instituto com o fim de com ele alcançar quem de fato e claramente está fora dele e não está desprotegido. A melhoria dessa proteção deve ser objeto de atividade legislativa.”

Processo: 1000100-78.2019.5.02.0037

 


Fonte: Migalhas

19 fev. 2020